A formaçao do homem

"O que um homem pode ser, ele tem de ser" A. MASLOW



domingo, 25 de agosto de 2013

A Crise da Fé na Época Contemporânea




Introdução
Quando me foi pedido para apresentar essa comunicação tive dois sentimentos: o primeiro de gratidão e louvor porque sabia que era uma oportunidade de sacudir meu acervo bibliográfico da Teologia Fundamental que estava empoeirado e dar as coisas vivas do livro aos sábios teólogos. Segundo porque tive minhas dúvidas, medos e temores porque era um trabalho que devia fazer com profundidade e brio, era uma responsabilidade. Mas também dúvidas medos e temores porque me fora apresentado um tema apodíctico. [1] E pensei: raciocínio desse tipo não e uma hipótese, alias as ciências teológicas não funcionam com hipóteses, mas verdades então, não adianta apresentar um raio x da época contemporânea, isso já estava feito cabendo a mim ir atrás do que já foi dito e apresentar o que penso sobre o assunto ai esta o desafio.
Sabemos hoje que a crise é generalizada afecta desde o minúsculo núcleo família até as instituições que supostamente pesamos ser bem organizadas e fortes (Família, Cultura, Política, Estado, Economia e Religião).
Portanto, partamos da seguinte formulação problemática que talvez pode ser real e concreta:  para Pe. Manuel Augusto, panorama eclesial actual, onde o carreirismo, os abusos e a duplicidade, a falta de coerência - tanto do clero, bispos e padres como de leigos - retiram credibilidade à missão cristã.[2] Na óptica de José Júlio[3] o problema é descrito nesses termos: é um dado inegável a Igreja Católica enfrenta hoje uma profunda crise de credibilidade diante da sociedade e uma crise de identidade (...) pois há realidades que exigem da Igreja um resposta-testemunho enraizada no Espírito Evangélico.
Podíamos formular o tema de milhares maneiras mas a variável Fé é sempre a constante as outras variáveis aparecem como sintomas e ou consequências desta, o que faremos ao longo do nosso trabalho é verificar as causas últimas desta crise. Que no meu entender não se trata de apenas crise da Fé, mas também da Esperança e da Caridade[4] em suma trata-se de uma profunda crise ética e metafísica. Resta apenas uma pergunta “como Viver a Fé hoje”?
Por razões de ordem de disciplina e didáctica vou apresentar os percursos que seguiremos: primeiro apresentaremos os limites conceituais: Crise, Fé, Contemporâneo; na segunda apresentaremos os antecedentes da crise e os Sintomas na comunidade eclesiais na terceira parte o impacto da crise na Fé cristã hoje por fim apresentamos a Conclusão e as respectivas Referências Bibliográficas. Espero ser útil nesse e empreendimento.



I. Parte Limites Conceptuais
1.1 Crise: é um conceito utilizado na sociologia, na política, na economia, na medicina, na psicopatologia, entre outras áreas de conhecimento, o que a primeira vista nos dizem é conjuntura  incertezas, dificuldades, perigos, momento decisivo de alteração.
Define-se também, como a perturbação temporária dos mecanismos de regulação de um sistema, de um indivíduo ou de um grupo. Esta perturbação tem origem em causas externas e internas.
A crise pode ser definida como uma fase de perda, ou uma fase de substituições rápidas, em que se pode colocar em questão o equilíbrio da pessoa. Torna-se, então, muito importante a atitude e comportamento da pessoa face a momentos como este. É fundamental a forma como os componentes da crise são vividos, elaborados e utilizados subjectivamente.
A evolução da crise pode ser benéfica ou maléfica, dependendo de factores que podem ser tanto externos, como internos. Toda crise conduz necessariamente a um aumento da vulnerabilidade, mas nem toda crise é necessariamente um momento de risco.[5]
Tais momentos da história humana são também altamente positivos ao nos fazer reavaliar juízos já consagrados, questionar práticas herdadas e, sobretudo a despertar em nós sempre a indispensável criatividade.
Sem duvida alguma, mesmo desconhecendo os estudos recentes sobre a sociedade actual todos nós sentimos na pele sejam as rápidas e sucessivas transformações socioculturais, sejam as múltiplas e desconcertantes leituras da realidade a nossa volta. E um fenómeno que atinge todos sectores nos quais vivemos. Todos nos sentidos um pouco estrangeiros, na sociedade actual, por não conhecer e assim dominar toda a sua enorme e variada realidade.
Também o cristão, embora reconhecendo ter uma vocação meta-histórica, que o faz viver diferente neste mundo não deixa de ser-deste-mundo, ele é ser-no-mundo (Heidegger), sujeito a suas reviravoltas, surpresas, imerso no conjuntural e no provisório, condicionado por contexto e problemáticas históricas. Desse modo, é sempre a partir de uma realidade concreta que deve viver sua fé. Nessa realidade que constitui o seu mundo pequeno ou grande, se encontra não só determinada configuração eclesial, uma determinada expressão teológica, uma determinada acção pastoral, todas se apoiando mutuamente. Pois a história nos mostra que ela não esta imune nem é impermeável, em sua dimensão instituicional, teológica e pastoral, ao contexto sócio-cultural onde se encontra.
Embora mantendo sua identidade teológica, ela se transformou de facto ao longo da história, não só porque seus membros eram filhos de uma época e de uma cultura, mas também porque ela quis realizar naquele momento a sua própria razão de ser. A saber viver e proclamar a salvação de Jesus Cristo para o mundo.
Não muito distante das teorias acima apresentadas, na linguagem de Sumo pontífice na sua primeira encíclica nos faz perceber que crise é “ausência da luz, confusão: momento em que é difícil distinguir o bem do mal, diferenciar a estrada que conduz à meta daquela que nos faz girar repetidamente em círculo, sem direcção”.[6]
É nesse sentido que entendo crise conjuntura de incertezas, dificuldades, perigos mas também momentos decisivo e de oportunidades. 

1.2 Fé: para entendermos “a crise da fé”, se não estou enganado, não estamos a falar de qualquer fé, mas da fé católica. Que se assenta em seus 2 pilares: No Deus Pai Todo Poderoso, No Filho Unigênito Jesus Cristo, No Espírito Santo Senhor que dá Vida (Trindade) e Igreja Católica Apostólica Roma. Nos escritos paulinos dizem que nasce da pregação. Também Primeira virtude teologal.
Esta é uma explicação minha e simplificada poderia ter feito um excurso do que é o conceito de Fé na Teologia  Fundamental cristã, quanto a isso recomendo o interessante estudo de Felipe Barrozo Arboith[7], Compêndio do Vaticano II: Constituições, Decretos, Declarações, e se alguém quer escavar mais desde as raízes aconselho Johannes Feiner & Magnus Loehrer: Fundamentos de dogmática histórico salvífica: revelação de Deus e resposta do homem. V.1 (Mysterium Salutis) entre outras bibliografias.
A Fé primeira virtude teologal, portanto tem sentido a afirmação que fiz na introdução de  que a crise da Fé não é só crise religiosa ou metafísica, mas também crise ética, a crise dos sentidos, nesse sentido têm todas as razão Enriques Rojas no seu livro o Homem Light, tem também todas as razão Gilles Lipovetsky  nos seus livros: Metamorfoses da cultura liberal,  A Era do Vazio: Ensaios Sobre o Individualismo Contemporâneo; para não citar Zigmunt Bauman e outros contemporâneos meus, que nos fazem entender que das cinzas da “morte do homem” não nasceu o “super-homem” como queria Nietzsche mas o Homem Light, Homem líquido com todas as consequências que esses adjectivos tem em todos os campos desde o económico ao religioso da crise da Fé Fundamental surge a light numa comunidade eclesial light com uma pastoral light.
O Catecismo da Igreja Católica é o documento que posso aconselhar para tiráramos uma definição que nos ajudara a seguir o nosso percurso: “pela Fé o homem submete completamente a sua inteligência e sua vontade à Deus com todo o seu ser, o homem dá seu assentimento a Deus Revelador”.[8] O documento segue na mesma senda do Vaticano. II, a fé é a resposta a Revelação de Deus, e só se presta a Ele e Sua palavra.[9]
E acto de Fé apresenta-se com varias características entre elas: é uma graça (CIC. 153); é um acto humano (CIC. 154); deve ser livre (CIC. 163ss) e possui um carácter Trinitário (CIC. 150).
É um acto pessoal mas não é acto isolado. Ninguém pode crer sozinho, assim como ninguém pode viver sozinho. Pois ninguém deu a Fé a si mesmo (CIC. 166-167). Com isso quero dizer que além do acto de crer ser algo individual próprio do ser humano é também um acto essencialmente eclesial... passamos da esfera individual para o eclesial. Crêr é próprio de toda Igreja. O Crente recebe o conteúdo da sua Fé através da comunidade eclesial e deve auxilia-la também na transmissão dessas verdades.[10]
 Para o prestigiado jovem filósofo francês, Charles Pépin: O acto de fé, que não é cego, pois tem as suas razões, implica, pois, pela sua própria natureza, a liberdade, é um acto livre. Não admira então que Tomás de Aquino (apud Pépin) tenha escrito que a fé convive com a dúvida. O crente autêntico é aquele que não acredita pura e simplesmente por ouvir dizer ou por educação ou pressão social. Como escreve Pépin, se alguém acredita verdadeiramente, é porque “parou um instante, duvidou, sentiu-se livre e deu esse passo”. [11]
Portanto para mim quando dizemos Crise de fé estamos a dizer incertezas, dificuldades perigos pessoais e das comunidades eclesiais em, momentos de trevas ou para citar o Papa Francisco “fome de luz”.[12]

1.3 Contemporâneo: originariamente a palavra diz-se do que é ou de quem pertence ao tempo actual, presente; que faz parte do nosso tempo; moderno ou novo; que pertenceu à mesma época; que viveu na mesma altura.
Filosoficamente esta palavra esta relacionada a uma determinada interpretação quadrífasica da história europeia ou do pensamento ocidental: Antiguidade, Idade Media, Tempos Modernos, e Contemporâneos. Esse é apresentado como a superação do obscurantismo medieval e os sucessos dos Racionalismos moderno e das Luzes.
Não se tem bem claro onde e quando começa mas recentemente a contemporaneidade é ligada ao processo pluriforme de Secularização, ao Iluminismo, Revolução Francesa com suas ideias de liberdade, igualdade e fraternidade. No campo das artes fala-se da Arte Contemporânea, Dança Contemporânea, Homem Contemporâneo, etc... etc. Todas significando algo de contrastante com o passado, a tradição, o convencional o clássico![13]
A impressão é de toda vida actual, flutua numa atmosfera rotulada de contemporaneidade, quando digo flutua, quero dizer que não tem fundamento, não tem base!
No fundo, ondas e mais ondas de mudança se sucedem em ritmo sempre mais acelerado como o Concílio Vat. II, sumariamente constatou e talvez com mais realismo Mendellin (1968) e Puebla (1979) captaram em sua profunda ambivalência.
Tudo quanto há de contemporâneo ou moderno possui sua própria atracção mágica. Muitas vezes acoplada ao mito do progresso e do desenvolvimento económico e social. A contemporaneidade não é fenómeno histórico indiferente ou neutro mas um fenómeno arrasador.      
De contemporâneo pode-se dizer muita coisa, filosoficamente é uma época que vai dos meados dos séculos XIX e chega aos Nossos Dias. Por ser mais próximo a nós parece ser o mais complexo e mais difícil de definir. Também é chamada a Pós-modernidade, ou mesmo os Nosso Dias.
Portanto, o nosso tema da reflexão é a Crise da Fé nos Nosso dias. O pensamento contemporâneo critica as ideias modernas e as recusa. Considera infundada e ilusórias as pretensões da razão no conhecimento e na prática, quando não um disfarce para o exercício da dominação sobre os seres humanos.
Dentre muitas características dessa época, importa salientar: o pós-moderno não admite a distinção entre Ordem Natural necessária e Ordem Histórica ou Cultural instituída pelos humanos: ambas são instituições humanas, contingentes, efémeras e passageiras. Não concebe o ser humano como animal racional dotado de vontade, livre, mas o concebe como um ser passional, desejante, que age movido por impulsos instintos, embora ao mesmo tempo instaure uma ordem social que reprime seus desejos e paixões. Desconfia da política: acredita que tudo é política mas, Política não tudo. Da importância a ideia da diferença.[14]

O Concílio Vaticano II enquanto acontecimento histórico profético enquadra-se nesse contexto, não é por acaso que o Papa João XXIII é tido entre os três profeta das contemporaneidade ao lado deles estão John F. Kennedy (35º p) e Martin Luther King. E apresenta um diagnóstico muito interessante na constituição dogmática Gaudium et Spes nr. 4 à 10 e sobretudo o nr 16. (Veremos adiante). Por isso digo e gosto de me alinhar ao lado daqueles que pensam que o Concílio Vaticano II é um “Projecto Inacabado” e pedir novo Concílio é irrelevante e desnecessário pois é um tesouro a descobrir!

Meus senhores e minhas senhoras! É nesse ecossistema em que é desafiada a missão crista: o mundo marcado pela diversidade cultural, pelo pluralismo religioso, e pelo conflito social e económicos é nesse contexto que sois chamados a Viver, Testemunhar e Anunciar a Fé. Como? Muitos de nos quer simplesmente anunciar a fe e o resto com que fica? É nesse sentido que quero dizer crise dos sentidos ou crise ética!
No dizer do papa Francisco “uma Igreja que não sai de si mesmo adoece, cedo ou tarde, no meio da atmosfera pesada do seu próprio fechamento. Mas é verdade também que uma Igreja que sai as ruas pode sofrer o que qualquer pessoa pode sofrer: um acidente (...) diante dessa alternativa prefiro vos dizer que prefiro uma Igreja acidentada do que uma Igreja doente... a doença típica da igreja fechada é ser autoreferencial, olhar para si mesma, ficar encurvada sobre si mesma, (...) uma espécie de narcisismo que nos leva a mundanidade espiritual ao clericalismo sofisticado... que o Senhor nos livre de maquiar o nosso episcopado com belas aparências da mundanidade, do dinheiro e do clericalismo de mercado (...)”.[15]
Repito, das cinzas de época contemporânea nasce um tipo de homem o Homem Light num sujeito, que tem por bandeira uma tetralogia niilista: hedonismo, consumismo, permisivismo. Todos eles impregnados de materialismos. Um indivíduo assim parece muito com certos produtos dos nossos dias: alimentos sem glicose, sem gordura, cerveja e champanhe sem álcool, tabaco sem nicotina, manteiga sem gordura, religião sem sacrifícios, renúncias ou exigências sem pecado, como profetizaram Agelo Hesnard (1971) no seu livro Moral sem Pecado. Um homem sem conteúdo, sem essência, entregue ao dinheiro, ao poder ao êxito e ao prazer ilimitado. Da época contemporânea nasce o Homem Light, alguém que carece de ponto de referência, vive num grande vazio espiritual e não é feliz, ainda que tenha materialmente tudo. Isso é grave é aqui onde a acção pastoral deve ser mais criativa, é aqui onde sem timidez temos que assumir a a bandeira da Nova Evangelização, sem temores deve sair dos papeis para o campo e não nos preocupar muito com a definição do que seja isso!
É aqui onde a acção pastoral interna e externa deve ser mais criativa sem necessariamente ser uma pastoral light, nos somos duma geração de homens com pensamento débil, (G. Vatimmo) vazios (G. Liposvestiky, J. Russ)  Homens Líquidos ou Gelatinosos, (Z. Bauman), Homens Fracos, Angustiados (Heidgger), Nausentos (Sartre). Homem contemporâneo ou light é frio, não crê em quase nada, suas opiniões mudam rapidamente, vive afastado dos valores transcendentais, por isso tornado cada vez mais vulnerável. 


       II. Antecedentes da crise contemporânea
Para a constatação de J. Russ, G. Lipovetsky, a Constituição Dogmática Gaudium Et Spes: sobre a igreja no mundo contemporâneo, ao tentar responder sobre causas da crise entre elas estão:

2.1 A falência dos sentidos: vivemos na era do vazio, em que as referências tradicionais desapareceram, em que não sabemos mais exactamente quais podem ser os fundamentos possíveis de uma teoria ética e religiosa. As bases tradicionais, metafísicas, religiosas se apagaram depois de Nietzsche, Freud e Marx que sociedade esperamos? Hoje fala-se da sociedade pois Freud.[16] Fala-se de um cristianismo não religioso (G. Vatimo), hoje nos círculos de debate filosófico fala-se de crer em Deus após a morte de Deus! Um cristão sério e comprometido com as promessas baptismais deve se questionar afinal que “deus está morto” (C. Pepin)? pelo menos o Deus de Abraão de Isaac e Jacob não! Pepin aponta o Deus que esta morto, nessa óptica coincide com o papa Francisco na Lumem fidei: o deus da razão filosófica faliu!

2.2 A morte das ideologias: desmoronaram as grandes doutrinas, políticas, éticas e metafísicas apregoadas pelos modernos. Desmoronaram a concepção de uma história em progresso não se da mais credito ao tema do proletariado, do género humano. Funciona a desilusão e a dúvida. O projecto global do Iluminismo faliu, divulgaram a ideia de que podemos alcançar a virtude sem ajuda de Deus e de Dogmas teológicos (Grotius, Bayle, Didorot, Kant) esta concepção esta nas profundezas das causas da crise na França no fim do século XIX. Estamos em luto e obrigados a inventar para sobreviver... hoje temos tanto a sede de Sócrates quanto a sede de Tomás de Aquino, Alasdair MacIntyre que nos diga!

2.3 O individualismo: para Nietzsche (apud J. Russ) é uma variedade modesta e ainda inconsciente da vontade de poder. Aqui o indivíduo se contenta em se libertar da dominação da sociedade quer seja Estado quer seja, Igreja. Esse individualismos contemporâneo significa passividade, apatia, indiferença, style cool, e descontraído, voltados a escolhas privadas e narcisista.[17]

2.4 As novas tecnologias: desde a Revolução Indústrial e Tecnológica as novas tecnologias engendraram um crescimento brutal dos poderes do homem tornando sujeito, mas também objecto das suas técnicas. A Técnica determina uma maneira de ser, um universo e não somente um conjunto de procedimentos decorrentes de um conhecimentos de leis científicas.
 
2.3 A confusão entre Colonização e Evangelização: no jubiloso ano 2000 fora publicada uma obra intitulada 500 Ano de Evangelização em África (Pe. Alberto Ferreira S.J ). Com os acessos debates sobre a Inculturação da fé em África, a Independência dos Países africanos, os métodos de evangelização colonial, chega-se a conclusões elusivas, a evangelização propriamente dita em África não tem nem meio século. Pois esta fé como tal começa também a assumir o rosto africano de forma livre com as independências embora com fortes sinais de sincretismo que até um certo ponto fora tolerada pelos próprios missionários isso mostra uma falta de clareza quanto ao que se entende por inculturação, mas também mostrou o erro da passada evangelização /colonização, hoje esses sinais prevalecem na vida da hierarquia da Igreja local assim como na vida dos leigos, Ex. vejam os nos nosso chefes mesmo sendo cristão católicos sentem que os mortos tem interferência na vida quotidiana por isso a eles devem sacrifícios.  

        III. Sintomas da crise na vivência da fé hoje (Sinai da crise na Igreja)
Para não se espalhar muito, no contexto das comunidades eclesiais a Crise de Fé que nos propusemos a reflectir é apenas um sintoma de um problema muito mais profundo, como disse nessa introdução, o risco nesta triagem é propormos remédio que virão curar apenas um sintoma e não profundamente o problema.
Penso que já ouviram falar da Nova Evangelização? Mas existem muitos temores quanto a essa proposta muito delicada. Já é uma proposta que vem do Concilio Vaticano II, Profundamente estudados nas encíclicas de João Paulo II, mas existem muitos temores, pois para a comunidade falante da Igreja não se trata de novidades de métodos para renovar o impulso evangelizador da Igreja mas e ajudar os cristão a reencontrar a alegria de viver e testemunhar a fé, a fidelidade ao Senhor Jesus.[18] Como fazer isso sem renovar os metodos?
Essa proposta vem para ajudar a resolver a profunda crise de credibilidade diante da sociedade e uma crise de identidade. Essa crise tem outras facetas: o nosso e episcopado contemporâneo encontra-se “maquiado com belas aparências da mundanidade, do dinheiro e do clericalismo de mercado”.[19]
Essa crise profunda tem o rosto de carreirismo (existem muitos sacerdotes que só estão para fazer carreiras, turismo a espera de uma oportunidade para promoção eclesiástica) e que tem levado muitos deles a estar sonegado, omissos e com uma “falsa prudência” que só pode confundir-se com imobilismo e indiferença (Victor Hugo Garcia), os abusos e a duplicidade, a falta de coerência – tanto do clero, bispos e padres como de leigos- retiram credibilidade a missão cristã.
Acrescentado a isso, os escândalos recentes do chamado Vatileaks mostram mais uma vez, que precisamos de um grande momento de reflexão, isso, retiram credibilidade a missão cristã. [20]
Dentro do campo moral hoje fala-se de Perda do Sentido de Pecado, afrouxou-se e relativisou-se muito o sentido compressão e a prática dos Sacramento da Cura: hoje temos longas filas de Baptismos, Crismas e todas as sextas-feiras as paróquias estão abarrotadas de enormes filas de jovens e velhos, casamentos e curtas e até inexistentes filas de penitência, contribuem neste sentidos não só a nova reflexão moral actual perpetrada por autores como M. Vidal entre outros, P. Ricouer, A. Henasrd, etc.
Queremos uma salvação sem Cristo, é nesse sentido quando digo Fé Light é isso, um seguimento de Cristo sem sacrifícios nem renuncias, sem sabor enfim uma religião light.
Infelizmente a unidade de pensamento e a comunhão de acção, mesmo dentro na Igreja não são fáceis de construir.
Para as outras ovelhas que não estão neste redil a acção religiosa combinam-se frequentemente com a mídia que parece divertimento com interesses económicos. Temos shoppings com capelas, Igrejas com ATM’s. Hoje mais do que nunca as acções religiosas de muitas religiões são regidas pelas leis do mercado e pelas leis do espectáculo, do show business, da distracção mediática. Nos tempos não muito distante ao nosso a religião apresentava uma face austera, categórica, respeitável, hoje a religião combina-se com o teleshow, uma religião sem obrigações nem sanções, ou seja um religião emocional descontraída que se manifesta sobretudo nos grandes desesperos humanos.  

IV. O impacto da crise na Fé cristã hoje
A sociedade Pluralista e Secularizada constitui um sério desafio, tanto para a comunidade eclesial como para o indivíduo cristão. Pois tanto a Igreja como os católicos individualmente estão marcados por uma experiência de séculos, mais conhecida por cristandade nessa época as doutrinas e crenças católicas constituíam as referências básicas da sociedade possibilitando a organização da vida social, hoje essas referências desvaneceram.
Paradoxamente, Moçambique pode até ter uma media populacional cristã, mas não suficientemente evangelizada (os sinais de sincretismo que apontei são exemplo claro), pois a maioria dos nossos contemporâneos cristão vê a Igreja como instituição com discurso que não os ajuda em sua vida quotidiana.
Entramos em águas turbulentas onde não mais funcionam as bússolas e as orientações dos que nos precederam. Com excepção do mundo da economia, regido por regras competentes, pela produtividade e pela eficácia nenhum outro sector da sociedade consegue sem dificuldades impor interditos ou regras de compromisso em vista ao bem comum. Quando tentam fazê-lo devem vir equiparados com discurso realmente justificados e convincentes, sob pena de não ser ouvidos. Cada um hoje é vigilante de cada um diz Michel Foucault na sua obra Vigiar e Punir, não só vigiamos a tua palavra mas a tua prática, e esse foi um dos sonhos da Revolução Francesa: sociedade transparente.[21] Em política fala-se de Boa Governação, Transparência (Accontability) em economia Gestão Corporativa, ou Participativa ou mesmo Cultura de Prestacao de Contas
Essa instabilidade cultural leva muitos de nos a buscar saídas para o impasse. Alguns cedem a tentação fundamentalista entregando sua liberdade a supostos  “gurus” das novas religiões em troca de ansiadas certezas. Outros buscam refúgio na experiência de sentimentos intensos, aliando-se aos movimentos pentecostais em algumas de suas variantes, como dizia meu professor de Religiões em Moçambique: “esses não estão preocupados com o anúncio do Evangelho mas se deram conta dos sintomas da crise e vão tirar os peixes das panelas dos outros”.[22]
Outros ainda partem para Crenças Orientais, talvez numa versão mais Light em busca de luz e sentido. Por nossa imperícia como Igreja mesmo, podemos dizer que em muitos casos essas válvulas de escape estão sendo utilizadas numa perspectiva de auto-ajuda, isto é, centradas no próprio indivíduo que as utiliza para seu conforto espiritual ou paz interior.
A insensível produção de bens materiais, embora a custa do empobrecimento de grande maioria de moçambicanos, e do planeta, aliada a sua sensação de um futuro incerto e ao enfraquecimento das convicções, torna problemática a crença cristã de uma outra vida feliz junto de Deus. Todos querem alcançar a felicidade aqui e agora, todos desejamos o reino de Deus em sua plenitude já nesta vida, sendo assim, a promessa divina de uma Eternidade bem-aventurada não mais constitui, como no passado, uma instância que da sentido e motiva as diversas renúncias próprias de quem vive a fé ou se aventura na caridade fraterna.
Em boa parte a Fé que vivemos hoje é uma Fé sem muita raiz, frágil, que explica bem a situação do homem de hoje. A nossa Fé é como a coluna de sal sem forças, um exemplo disso já está na Sagrada Escrita o mito da esposa de Ló.[23] “Se o sal perde a força com que haverei de salgar?” (Cfr.)
Para o homem tornado adulto, orgulhoso da sua razão, desejoso de explorar de forma nova o futuro, a pastoral da transmissão da Fé já não é suficiente, para estes hoje, na linguagem do Papa Francisco, citando Carinhosamente o Jovem Nietzsche a fé para o homem contemporâneo é uma luz ilusória que o impede de cultivar a ousadia do saber, pois ele convida a sua Irmã Elisabeth a arriscar percorrer novas vias... para o jovem Nietzsche a fé é tida como escuridão (...) e quando falta luz, tudo se torna confuso: impossível distinguir o bem do mal, diferenciar a estrada que conduz a meta daquela que nos faz girar repetidamente em círculo sem direcção.[24]

          
        Conclusão
Enfim não é meu interesse esgotar o assunto aqui, em forma de fecho quero apenas apontar alguns pontos que podem nos ajudar a sair desse marasmo eclesial actual e devolver aos Católicos a alegria de (re)acreditar e (re)testemunhar a própria Fé, mostrar aos nossos contemporâneos como o Evangelho de Cristo contem respostas a sua inquietante procura de beleza, de bondade de verdade e de felicidade:

Primeiro: 50 após o Concílio Vat. II, sinto que aquele Projecto ainda não foi concluído, e levara anos até gerações para que isso aconteça.
Segundo: Dentro das propostas emanada do Concílio Vat. II, pessoalmente devíamos diante da complexa realidade do Mundo Contemporâneo e particularmente encontrando-se a passar o Ano da fé, devíamos explorar mais a Nova Evangelização não em teoria mas na prática, penso que isso não só ajudaria a  Renovar o Impulso como também ajudaria os cristão a reencontrar a alegria de testemunhar a Fé sem vergonha. Deixemos os problemas definitórios do termo e vamos analisar cada contexto seus problemas e verificar se a solucao que se adequa e ate se for preciso ReEvangelizar!
Terceiro: as crises, dificuldades e confusões na Igreja sempre houveram e as que estamos passando não são uma crise por isso não devem contudo de impedir-nos de ver todos o quadro que a comunidade de Jesus começou pela intervenção do Espírito Santo, que é sua alma e sem a qual ela não existiria.
Não só isso, por fim quero dizer que passaram 50 anos depois do Concílio Vat. II, o mundo e o submundo mudaram muito, surgiram novos desafios, da globalização financeira e a consequente consciência planetária, a dissolução do impérios soviético, as novas formas de comunicação social (Internet, Redes sociais etc.) que unificam o Mundo estamos cada vez mais juntos mas individualmente (PP. J. Paulo II, Z. Bauman). O evangelho precisa chegar até lá no submundo do coração humano.
Enfim, não se trata apenas de uma Crise de Fé mas de sentido trata-se de uma crise da Esperança e da Caridade, trata-se de uma profunda crise teólogal. Os caminhos da Fé, da Esperança e da Caridade estão minados! O ambiente está turvo, Senhor vinde em nosso auxílio!
Essa crise é momento de prova mas também é uma grande oportunidade para explorar o que não exploramos no Concilio Vat. II. Para nós é um momento de vinho novo em odres novos. A sociedade precisa de remendos novos embora padecendo de velhos problemas!
Termino com a pergunta que é milenar quanto a humanidade: quando o fundamento da nossa fé (Jesus Cristo) voltar encontrara a Fé sobre a Terra?

Referências Bibliográficas

ALÉM-MAR, Vaticano II: um tesouro a descobrir, nr. 618, Ano LVI. Outubro de 2012
Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1975.
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA: edição típica vaticana. São Paulo: Loyola, 2000.
CHAUI Marilena, Convite à filosofia, Ed. Ática, 13ª  edição,  São Paulo, 2005.
COMPÊNDIO DO VATICANO II. Constituição. Decretos. Declarações. 29 ed. Petrópolis: Vozes, 2000.
Dicionário de língua portuguesa, Novo dicionário Aurélio, (versão eletrônica). 
FEINER, Johannes; LOEHRER, Magnus. Fundamentos de dogmática históricosalvífica: revelação de Deus e resposta do homem. Tradução de Belchior Cornélio daSilva. Petrópolis: Vozes, 1965. V. I/4 (Mysterium Salutis)
FISICHELLA, Rino. Introdução à Teologia Fundamental. Tradução de João Paixão Netto. São Paulo: Loyola, 2000.
FOUCAULT, Michel., Vigiar e Punir: Nascimento da prisão, (tradução de Raquel Ramalhete), 35ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
FRANCISCO Papa, Lumen Fidei, Roma, Junho, 2013,
HARING, Bernhard, Problemas actuais de teologia contemporânea, Ed. Perpétuo Socorro, Porto.

Jean-Bertrand Pontalis,  Après Freud, Ed. Gallimard.

LACOSTE, Jean-Yves. Dicionário Crítico de Teologia. Tradução de Paulo Menezes. São Paulo: Paulinas; Loyola, 2004.
LEERS Bernardino, Moral Cristã e autoridade do Magistério: Conflito e Dialogo Ed. Santuário, Aparecida, SP., 1991,
LIPOVESTSKY Gilles. Metamorfoses da cultura liberal: ética mídia e imprensa, Ed. Sulina, Brazil, 2004.
Notas pessoais, das aulas de Religiões em Moçambique, (Pe. Alberto Ferreira),ISMMA, 2008.
PÉPIN Charles, Un homme libre peut-il croire en Dieu? Ed. L’Opportun, Paris, 2012.
Revista de Theologia, Felipe Barrozo Arboith, O conceito de fé na teologia fundamental cristã, Ano 2008, Volume 2, No.1
ROJAS Enrique, Homem Light, ed. Gráfica Coimbra, Madrid.
RUSS, Jacqueline,  Pensamento ético contemporâneo, 4ª Edição, ed. Paulos, São Paulo, 2006
URBINA, César Izquierdo. Teología Fundamental. Barañain: EUNSA, 1998.           
VIDA NOVA, A renúncia de Bento XVI: Boas vindas ao papa Francisco, Ano 53, Nr 628, Abril de 2013, p. 12.
VIDA NOVA, Carvão de Moçambique: Região em Brasa, Ano 53, Nr 632, Julho de 2013,
VIDAL, M, Nova Moral Fundamental: o lar teológico da ética, São Paulo: Editoras Santuário e Aparecida. 2000.


Notas bibliograficas a conferir 

5

[1] É raciocínio, necessariamente verdadeiro, quer por evidência, quer por demonstração. E não precisa ser demostrado. Cfr. Dicionário de língua portuguesa, Novo dicionário Aurélio, versão eletrônica. 
[2] Cfr. ALÉM-MAR, Vaticano II: um tesouro a descobrir, nr. 618, Ano LVI. Outubro de 2012, p. 13.
[3] Cfr. VIDA NOVA, A renúncia de Bento XVI: Boas vindas ao papa Francisco, Ano 53, Nr 628, Abril de 2013, p. 12.
[4] Podemos atestar essa hipótese verificando desde a primeira Encíclica de Bento XVI as encíclicas ate a “sua” última Lumen Fidei.
[5] Cfr. Dicionário de língua portuguesa, Novo dicionário Aurélio, versão eletrônica. 
[6] FRANCISCO Papa, Lumem Fidei, nr. 03.
[7] Revista de Theologia, Felipe Barrozo Arboith, O conceito de fé na teologia fundamental cristã, Ano 2008, Volume 2, No.1
 
[8] Catecismo da Igreja Católica, nr. 143.
[9] Cfr. VATICANO II Concílio, Constituição Dogmática Dei Verbum: sobre a Revelação Divina.
[10] ARBOITH Felipe Barrozo. Op. Cit. p. 15.     
[11] Cfr. PÉPIN Charles, Un homme libre peut-il croire en Dieu? Ed. L’Opportun, Paris, 2012.
[12] FRANCISCO Papa, Op. Cit. nr. 1.
[13] LEERS Bernardino, Moral Cristã e autoridade do Magistério: Conflito e Dialogo Ed. Santuário, Aparecida, SP., 1991, p. 112.
[14] Cfr. CHAUI Marlena, Convite à filosofia, Ed. Ática, 13ª  edição,  São Paulo, 2005. pp. 50ss.
[15] VIDA NOVA, Carvão de Moçambique: Região em Brasa, Ano 53, Nr 632, Julho de 2013, p. 6.

[16] Cfr. a obra de Jean-Bertrand Pontalis,  Après Freud, Ed. Gallimard.

[17] Cfr. as obras de ROJAS Enrique, LIPOVESTSKY Gilles. Opus citatum.
[18] Cfr. Pe. Manuel Agusto Revista Alem-Mar, Op. Cit. p. 13.
[19] Vida Nova Julho de 2013, p. 6.
[20] Cfr. as duas revistas: Vida Nova de Julho 2013, Pe. Manuel Agosto na Revista Além-Mar, nr. 618, Ano LVI. Outubro de 2012, p. 13.
[21] FOUCAULT, Michel., Vigiar e Punir: Nascimento da prisão, (tradução de Raquel Ramalhete), 35ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
[22] Notas pessoais, das aulas de Religiões em Moçambique, (Pe. Alberto Ferreira),ISMMA, 2008.
[23] LEERS Bernardino, Op. Cit. p. 14.
[24] FRANCISCO Papa, Op. Cit. nrs. 2 e 3.